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Pinhal Novo, Palmela- Setubal, Portugal
Pastora Auxiliar na COMUNIDADE CRISTÃ JESUS CRISTO É O SENHOR,discipula, serva, filha legitima por DNA do Senhor Jesus Cristo. Mae, esposa,filha, profissional.

sábado, 13 de agosto de 2011

Capítulo II


A Fuga


Os dias pareciam empurrados por uma tartaruga velha, mal das pernas, mal disposta e com azia, pensava Tinho todas as manhãs, acordara muito cedo naquele dia, mas ficara sentado na cama a pensar, era o último dia de aula, mas ainda faltava uma semana para seus anos, ou seja, uma semana sem ver a dona Clarissa, uma semana sem pequeno almoço como devia ser. Uma semana! Era muito tempo! 


Clarissa já estava sentada na cama mais de 30 minutos, sentia-se paralisada, não conseguia levantar-se nem tão pouco pensar, estava em pânico, só faltava uma semana, como se arrependera de ter dito sim, e agora? Tinho iria descobrir que era uma fracassada e como todas as outras crianças iria odiá-la, se bem que era digna de ódio, era repugnante, mas aos olhos de Tinho era uma princesa e sentia-se como tal ao pé do miúdo, afinal de contas ele era a única coisa boa na sua vida e agora só faltava uma semana para perder tudo.


O dia fora típico de inicio de verão: ansiedade, expectativas e muito planeamento para meses de sol e calor, mas Tinho e Clarissa carregavam o peso dos dias nas costas.  Tinho não queria comemorações, nem planeamentos, queria que os dias passassem rápidos e fossem menos doridos. Ao longe Clarissa olhava fixamente para Tinho, queria tanto aproximar, falar com o miúdo, abraça-lo, pô-lo no colo, mas sentia um medo disparatado, não sabia de onde vinha, sabia apenas que estava vivendo dias de pânico, olhou para o relógio, passava-se das horas, o tio nunca atrasara tanto para buscar Tinho, suspirou fundo e foi em direção ao miúdo.
Então?
Deve ter havido um furo no pneu da camioneta
Pois, já passam das seis da tarde, tenho que ir a padaria buscar uma encomenda para minha madrinha, a senhora da padaria esta a espera.
—Posso ir consigo? — Clarissa hesitou — Não mexo em nada
—Não é isso, seu tio pode chegar e não encontrar-te aqui e ficar chateado — Tinho baixou a cabeça — Mas tudo bem, hoje é o ultimo dia de aula, ele não há de importar-se.


Os dois caminharam em direcção a padaria, ao longe a camioneta do tio apontava, Tinho olhou para trás viu o tio, correu desorientado, mas suas perninhas frágeis e pequenas não tinha velocidade, ao longe o tio avistou, acelerou e foi-se, Tinho sentou-se no passeio, Clarissa sentiu as pernas desfalecerem, sentiu o vômito aproximar da garganta, O que tinha feito agora? Suspirou, contou ate dez, agora não, não podia desmaiar agora, era agora o auge do pânico, mas precisava falar, precisava dizer qualquer coisa ao miúdo.


Ele deve voltar não é?
Não, ele não vai voltar
Tem que voltar, não pode te deixar aqui assim. Já sei! Vamos a esquadra, dizemos que o seu tio não apareceu e pedimos para ele levar-te.
Se o policia for levar-me meu tio vai ficar muito bravo, eu vou a pé mesmo.
—Enlouqueceu? São mais de vinte quilómetros ate a quinta do teu tio, chegará lá amanhã.
Não tem problema, assim ele não fica tão chateado, vai encarar a minha caminhada como um castigo.
Ora essa miúdo, de onde tirou essa ideia? Seu tio não deve ser assim tão maluco
Já fez isso antes
Como? Já fostes a pé para a quinta?
Sim, quando você me deu essa camisola, ele ficou furioso e me deixou no caminho, fui a pé para casa, cheguei o dia já estava a nascer.
Chega! Chega disso, não posso mais! Disse Clarissa desorientada, não queria, mas sentiu uma gota quente correr pelo rosto. Venha, vamos!
Para aonde?
Para casa, vai para minha casa e de lá não vai sair, se o seu tio quiser, ele que venha buscar-te.
Clarissa pegou a mão de Tinho e saiu puxando-o, o miúdo acompanhou-a em silêncio, chegou em casa, abriu o portão devagarinho, iria para o seu quartinho nos fundos, depois falaria com a madrinha.
Clarissa é você?
—Sim madrinha, já cheguei
—Trouxe a encomenda?
—Não tive tempo madrinha, amanha bem cedo eu busco, tudo bem?
—Esta bem Clarissa. Esta tudo bem contigo? — Disse a madrinha abrindo a porta — Entao, quem é o miúdo?
É uma longa história madrinha Disse Clarissa sentindo o sangue ferver na cara.
Otimo Clarissa, leve o miúdo para dentro e venha contar-me a história. Disse a madrinha em tom ríspido.
Sim senhoraClarissa levou Tinho para o seu quartinho Eu volto já meu querido, apenas vou falar com minha madrinha e volto logo, não saia daí, tome, coma são bolachinhas de nata, são muito boas.
Trinta minutos depois Clarissa voltou, tinha a cara carregada e pesava-lhe os ombros, tinha duas taças de sopa, duas fatias de pão, queijo, algumas frutas e um doce, Tinho olhou estupefacto, nunca tinha visto tanta comida.
Vamos jantar?
Sim
Como a vontade, se quiser mais sopa ou mais pão eu busco
Tudo bem.
Tinho comeu como se fosse a primeira ou a ultima refeicao de sua vida, Clarissa olhava tristemente para o miúdo, abriu o sofá cama a sua frente, preparou a caminha para o miúdo, sentia tanta dor no peito que custava-lhe respirar, arranjou a loiça do jantar e disse para Tinho deitar-se, o miúdo deitou-se, suspirou de certa forma aliviado, pela primeira vez desde sempre teria uma noite agradável, sentia-se seguro e de barriga cheia, era duas sensacoes muito boas, o amanhã? Não queria pensar nisso agora, só queria ficar ali quietinho e pensar que estava ali bem pertinho da dona Clarissa, era tudo que importava, o resto era resto e pronto.


Ao lado Clarissa deitou-se lentamente na cama, não conseguia parar de ouvir o que a tia havia dito-lhe, tinha sido de certa forma cruel, não esperava ouvir aquelas coisas da madrinha, sabia que não era muita coisa, não fazia nada certo, mas ser um empecilho naquela casa, nunca tinha pensado nisso, sempre pensara que fazia companhia a madrinha, e que ela gostava da sua presença e companhia, mas ouvira a madrinha dizer em alto e bom tom “você sempre foi um empecilho na minha vida, não quero mais um”. Aquilo doera mesmo, so apetecia morrer, se estivesse sozinha naquela noite iria por um fim naquilo tudo, mas não podia, não naquela noite.


Clarissa rolou na cama, acendeu a luz do candeeiro, já passava das quatro da manhã, não conseguira se quer fechar os olhos, o sermão da madrinha passava-lhe pela cabeça na íntegra, cada palavra, cada expressão corporal, cada outro discurso nas entrelinhas, chegara a conclusão de que não podia mais viver ali, se iria morrer tinha que pelo menos ter a dignidade de não faze-lo a ali, Clarissa levantou de sobressalto.
Tinho, acorda meu querido, acorda Sacolejou o miúdo
Já é de manhã? Perguntou sonolento
Não, preciso perguntar-lhe algo Disse ansiosa Aonde é o seu lugar secreto?
Longe, muito longe
Quanto “longe”?
Na floresta dos adeus 
Esta de brincadeira não é?
Não, é verdade
Ninguem entra naquela floresta sabias?
Eu entro, já entrei e sai várias vezes, é la o meu lugar secreto
Há anos que ninguém entra la, e sabe porque? Muitos entraram mas nenhum saíram com vida, e os corpos dos que entraram apareceram boiando rio abaixo, a floresta mata-os e depois devolve-os, chama floresta do adeus porque quem entra não volta.
Isso não e verdade, vou la toda a semana, não há nada alem de arvores e pássaros. Já não quer ir passar o dia dos meus anos la?
Não Tinho mareou as vistas Vamos para lá amanhã, bem cedo, agora volte a dormir, eu cuido de tudo.
Clarissa voltou a deitar, tinha um brilho estranho no olhar, sentia o coracao bater na garganta, apagou o candeeiro e virou-se para parede e resmungou baixinho.
Nunca mais irão nos magoar querido, nunca mais…
Tinho remexeu na cama, o corpo parecia dorido, afinal de contas nunca dormira numa cama tão macia, olhou para os lados não vira Clarissa, tinha uma imensa mala em cima da sua cama e alguns sacos, olhou sem perceber nada.
Esta pronto belo adormecido? Temos um longo dia para frente Disse Clarissa bem disposta entrando no quarto com pão e leite para Tinho.
Vamos aonde?
Para casa Sorriu excêntrica Vamos para o nosso lugar secreto, nunca mais ninguém vai poder encontrar-nos ou magoar-nos, nunca mais, eu vou cuidar de você e você vai cuidar de mim, seremos a nossa família, somente nós os dois Disse ajoelhando aos pés do miúdo Somente nós dois meu querido.


Clarissa levantou deu uma ultima olhando para tudo, o táxi apitou la fora, ela olhou de relance para a casa da madrinha, estava tudo muito bem fechado, a tia teria uma grande surpresa ao acordar, a carta dizendo grandes verdades, e o maior de todos os gran finale, suas jóias, preciosas jóias, aquelas que ela havia guardado com tanto esmero, levaria todas, não pelo dinheiro, mas pela honra, a madrinha tinha tirado algo dela, sua dignidade como ser humano, agora tiraria algo da madrinha, sua identidade, crescera ouvindo a madrinha dizer que suas jóias eram a sua identidade, pois bem, já não as tinha mais.


Tinho pegou os sacos e Clarissa a grande mala, levava tudo que pertencia-lhe por direito e honra, a madrinha não tinha o direito de destruir a sua vida e seus sonhos, agora não pertencia mais a ninguém, apenas a Tinho, agora era um do outro, ninguém os afastaria, nunca mais ficaria sozinha, jamais deixaria Tinho ir embora, jamais sairia daquela floresta, morreriam os dois, ninguém sentiria a falta dos dois, jamais os procurariam, ninguém jamais imaginaria que teria ido para a floresta, e mesmo se soubessem não iriam se arriscar pelos dois, suspirou aliviada entrando no táxi, deu uma ultima olhada para a casa, não voltaria nunca mais ali.


Para aonde dona professora? Perguntou o taxista
Ah… titubeou
Para a ponte dos solares, vamos acampar no rio. Desembaraçou Tinho.
É bem longe, so vão vocês os dois? Coscuvilhou o taxista
Não, alguns amigos estarão a nossa espera Mentiu Clarissa
Tudo bem, e meio perigoso para aqueles lados, não fica muito longe da floresta do adeus, tive um primo que desapareceu por la, nunca mais foi encontrado, dizem que de todos que entraram la apenas um voltou?
Não sabia que havia voltado alguém de la. Indagou curiosa Ah sim, voltou sim, cheguei a conhece-lo, era um puto desse tamanho Disse apontando para Tinho. Mas voltou maluco, dizia um monte de disparates, um dia simplesmente desapareceu, dizem que a floresto o pegou de volta.
E o que ele dizia? Perguntou Tinho curioso
Nada que faça sentido, dizia que a floresta era viva, somente entrava ou saia quem ela quisesse, e que lá tinha uma cabana e que todo segredo estava lá, a cabana do tempo, dizia que o dono do tempo morava lá, era ele que geria o tempo. O tempo da chuva, do sol, de nascer, de morrer, de coisas boas acontecerem e de coisas ruins também.
Bela historia!  Ironizou Clarissa
Pois, como disse, ele voltou malucado.
Mas há mesmo uma cabana na floresta _ Disse Tinho entusiasmado
Como?
Já tínhamos ouvido essa historia não e Tinho? Clarissa piscou a Tinho, não podia arriscar do taxista saber para aonde iriam, ele conhecia todos na cidade, inclusive a madrinha.
A viagem correu silenciosa dali para frente, a cada metro Clarissa ficava mais ansiosa, Tinho estava tranquilo, estava em paz, nunca sentira-se tão seguro, o que custava-lhe era pensar que talvez aquilo pudesse ser tudo um sonho. Chegaram ao destino, a ponte dos solares, Clarissa pagou ao taxista que parecia querer esperar que os supostos amigos aparecessem, mas Clarissa tratou logo de despacha-lo, ao ficarem a sós, Clarissa suspirou.


Entao Tinho, tudo bem? Vamos para casa?
Sim, sei de um atalho pelo rio, chegamos la em quarenta minutos, já andei por esses lados.
E aquela historia da cabana, já viste mesmo uma cabana?
Sim, é a minha cabana, é o meu lugar secreto
Tinho, e mesmo verdade esse seu lugar secreto? Porque se não for, não importo-me
Vais ver, e tudo verdade, mas não fui eu quem construiu a cabana, ela já estava lá, eu só arranjei ela. Vamos morar la, tem cama, cadeira, um fogão de lenha, e tem o meu riozinho cheio de peixinhos que construi, e tem um lindo jardim, as flores crescem la como se fosse mágica. Contava com todo entusiasmo.
Esta bem Tinho, logo vamos ver, logo vamos ver, agora vamos descansar, pois essa mala esta muito pesada  


Caminharam a passos lentos e em silêncio vários minutos, nenhum dos dois estavam acostumados a grandes conversas, cada qual regurgitava seus pensamentos para a alma,   Clarissa já estava a beira de desistir da grande e pesada mala, mas seria a última coisa que faria, não iria desistir, aquela mala era o que restara da sua dignidade, era a única faísca a última gota de  sua honra como ser humano, era o que lhe mantinha ainda no mundo dos sóbrios, tinha a impressão de que se perdesse aquela mala perderia o resto de lucidez que ainda a mantinha de olhos abertos e sob as pernas, olhava para o raquítico miúdo a sua frente, os sacos de mantimentos que pegara na madrinha eram maiores que o menino, não queria pensar demais, não era conveniente pensar  àquela altura, apenas sabia que estava agindo inconsequentemente, mas e daí? Seria seu último ato inconsequente de todos, acreditava nas lendas da floresta, quem sabe teria sorte pelo menos uma vez na vida e então seria o fim de tudo. Já planeara como seria enterraria a mala no sitio mais remoto que conseguisse encontrar  na floresta, seria sua libertação, enterraria os sonhos da madrinha, assim como ela enterrara os seus, depois arranjaria um sitio ao pé do rio e esperaria a morte junto a Tinho, pelo menos não morreria sozinha, e então, descanso, finalmente!  Sorriu .


—Chegamos!
—O que? Indagou saltando de seus delírios Já chegamos a floresta?
Sim, olhe! Disse Tinho mostrando um amontoado de arvores a frente
É menos assustadora do que pensei Disse desiludida.
Pois é, venho aqui toda semana, não há nada para temer alem de alguns coelhos e no máximo algumas corsas, repteis e insectos.
Sorte a nossa, não é? Disse céptica Vamos fazer um lanche antes de entrar na floresta? Já são mais de dez horas e essa caminhada toda deu-me fome.
A mim também.


Sentaram na relva fresca ainda da alvorada, o sol estava fulgurante como um miúdo e seu cão, Clarissa chegou a ter pena de deixar a vida, era um dia lindo, mas sabia que não podia viver naquela floresta, sentia tanto de estar a enganar Tinho, mas também sabia que seria o melhor para o miúdo, teria um dia de alegria e sonhos, talvez dois, deixariam a vida feliz. Era um dia lindo, podia absorver o cheiro do dia, da relva, das flores, do sol, era uma sensação muito estranha, não se lembrava de ter sentido a vida assim daquela maneira, por instantes pode esquecer o peso da mala e sentir-se feliz, mas logo voltou o olhar para o símbolo do seu fracasso como ser humano, engoliu com força o pedaço de pão que mastigava lentamente espancando a garganta, não podia fugir da sua realidade, não tinha opção, não tinha saída, era o fim.


Tinho mastigava lentamente pois o olhar fixo na floresta lhe trazia uma paz  da qual nunca tivera antes, tinha valido a pena esperar e acreditar, estava tão perto, so faltava alguns passos e tudo se acabaria, as dores a solidão a rejeição, tudo ficaria para trás, sabia que estava fazendo o melhor para Clarissa, o mundo não merecia-a, sabia que estavam destinados a ficarem juntos para sempre teve apenas que esperar, fora uma espera dorida, mas agora estava tão perto, não podia fugir da realidade, tinha chegado o momento, era o início de tudo.


Levantaram da relva, cada qual com o seu peso, suspiraram ao mesmo tempo, era o início o fim. Caminharam em direção a floresta, os coracoes asfixiava a voz, os olhos de Clarissa brilharam, Tinho sorriu, entraram na floresta. Clarissa sentiu o coracao parar, teve a sensacao de que desmaiaria, suspirou fundo, precisava de ar, olhou para os lados, não havia nada de extraordinário alem de arvores de um verde intenso, pássaros cantarolantes e grilos gritantes, de certa forma respirou aliviada. Tinho tinha as vistas fixas na trilha improvisada, estava seguro de si, sabia para aonde estava a ir.


Entao, ainda esta muito longe querido, já estamos a andar há quase uma hora, já não posso mais com essa mala Reclamou Clarissa
Ainda falta um pouco, a nossa casa e bem no interior da floresta, devemos ainda andar mais de uma hora.
Valha-me Deus! Não disseste que era tão longe!
Deixe-me levar a mala um pouco!
Não!!! Disse quase a gritar Não precisa querido, eu ainda aguento
Quer parar?
Mais trinta minutos e almoçamos, tudo bem?
Esta bem, logo chegaremos a uma clareira com uma árvore frondosa, lá também é meu, gosto de descansar la, e muito agradável, a relva e macia, poderemos ate descansar um bocado.
Isto soa bem “descansar”…
Disse a pensar que poderia ser um bom lugar para enterrar o seu fracasso. Tinha que se livrar daquele peso, seria o primeiro passo da sua libertação. Caminharam em silêncio, a tal clareira parecia não chegar nunca, a cada instante a mala pesava mais, na verdade não acreditava que existisse cabana ou muito menos clareira, mas iria em frente, seu plano era real, era o suficiente.
Chegamos! Disse Tinho eufórico
Oh! Exclamou maravilhada É belíssimo!
Clarissa estava em êxtase,  nunca vira algo tão belo, apenas em seus sonhos, a relva verdíssima fazia contraste com as tulipas selvagens a árvore era estupendamente grande e as raízes fazia a espécie de cadeiras, com o sol escaldante do meio dia aquela sombra era convidativa e aconchegante, Clarissa ficou ali a olhar  na tentativa de convencer os seus olhos de que aquela paisagem a sua frente era realmente de verdade.
Vamos almoçar? Interrompeu Tinho
Claro
Venha
Tinho pegou-a pela mão e levou ate a arvore, Clarissa sentou numa das raízes, e suspirou fundo, como aquele sitio cheirava bem, podia sentir o cheiro da árvores, das raízes, até mesmo de água.
Estou com tanta sede Implorou Clarissa
Fique aqui, vou buscar agua, o rio passa logo ali Disse indicando com o queixo
Tinho Exclamou consternada Se calhar seria melhor ficarmos aqui mesmo, não acha?
Claro que não! exclamou enérgico Temos que ir para casa, aqui a noite é frio e muito escuro, almoçamos e descansamos um bocado, depois caminhamos mais uma hora e já chegamos, esta bem?
Esta bem Tinho, esta bem. Concordou Clarissa submergindo em seus pensamentos


Alguns minutos depois Tinho voltara com agua fresca, era tão boa que Clarissa bebera como se nunca tivesse bebido agua antes, era inebriante, viciante, bebia e sentia-se saciada mas queria um pouco mais, era tudo muito estranho.  Comeram sandes de queijo com fiambre, estava tão saborosa que resolveram comer mais uma, Clarissa não se importava, tinha trazido muita comida, não iriam precisar de tanto, comeram depois uma banana e uvas fresquinhas. Tinha sido um bom almoço, até ali estava sendo um dia agradável, as vezes sentia algo tão bom, mas não podia se dar o luxo de sentir aquilo, não podia desgarrar da desgraça, tinha que lembrar-se dela para ter coragem de largar a vida, precisava fazer isso, era a sua missão por si e Tinho. Após comerem recostaram no tronco da árvore, Clarissa tinha a sensação de que era macia, sentiu uma leveza no corpo e as vistas ficaram embaciadas  e pesadas, sentiu um aroma bom de flores, tinha direito de sentir-se bem alguns minutos, soltou os ombros e dormiu, sonhou, sonhou com flores, flores e agua cristalina, ao lado Tinho a olhava com um imenso sorriso na cara, olhou para a copa da árvores as folhas se balançaram, Tinho suspirou aliviado, virou para Clarissa e murmurou baixinho. 


Nunca mais minha querida, nunca mais ninguém irá nos magoar, está segura aqui, para sempre.
Tinho acorda, rápido, acorda! Gritou desorientada Rápido Tinho!
Clarissa!
Tinho abriu os olhos assustado, Clarissa estava em pânico, ao redor deles era apenas escuridão e agua, chovia a cântaros, aquele sitio não parecia o mesmo de minutos atrás. Clarissa não podia acreditar, aquele não era o mesmo sitio aonde almoçaram, estava tudo escuro, não conseguia se quer ver o chão aonde pisava.
Tinho, viu a mala? Gritou Clarissa
Não, temos que ir para a cabana logo, a chuva esta a aumentar e esta a ventar muito, temos que ir.
Preciso encontrar a mala, não vou sem ela
Vamos logo dona Clarissa, por favor! Implorou Tinho
Não sem a minha mala
Clarissa sentiu o vento forte abalar sua estrutura, ouviu as árvores rugirem alto como monstros, sorriu, porque estava tão preocupada? Que parva estava a ser, tinha ido ali para isso, para morrer, chegara a hora, agora era só esperar e esperar que fosse breve e pouco doloroso. Clarissa sentou-se no chão, Tinho ajoelhou a sua frente, tocou o seu rosto, conseguia ver na escuridão o rosto raquítico do miúdo.
Vamos para casa minha querida, agora não falta muito, precisa ter apenas mais um pouquinho de paciência e força.
O que está a acontecer Tinho? Fica aqui comigo, abraça-me querido, não deixe-me sozinha por favor!
Não vou deixar-te nunca, prometo, fecha os olhos, estou aqui. Disse Tinho seguro de si Vai passar, calma, vai passar.
Clarissa não queria, esforçou-se para não fechar os olhos, sentia os pingos gélidos da chuva na pele, mas não podia resistir, fechou os olhos, teve a impressão de ouvir passos e a voz de um adulto, era a morte, agora sabia que chegara a hora.  Que bom que a morte não era tão dorida, era mais simples morrer do que pensara, sorriu e tudo desaparecera.

Um comentário:

  1. Muy interesante. Buen texto. Un gusto seguirte. Te envío un cordial saludo deseándote un buen fin de semana. Muchas bendiciones para ti.

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